quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Mal-me-quer

Você fica acompanhando meus insucessos
estrelas cadentes que são dispersadas pelo microfone
bolhas abortadas ao menor contato com o que é limpo.

Você lambe o cotonete cheio de cera que eu acabo de retirar do ouvido
mastiga meu absorvente usado
e diz que é o seu manjar dos deuses.

Manje como a manga é azeda
e o leite das minha tetas é ácido
e rói suas vísceras estilhaçadas
feito cacos podres de espelhos.

Amanhã a mesa estará posta
e no final da refeição as moscas irão pousar nos restos de alimento
farelos de bolo que você rejeitou.

Se eu fosse feliz não escreveria poemas.
Pena por pena eu desfolho a ema.
Porque a avestruz já está nua em pêlo.
E o elo da cadeia -
a algema -
envolve o meu pescoço como eu queria:
doce carícia
a suaves prestações.

O lençol que não deixaram amarrotado
está esgarçado
como a minha alma fétida e podre que nem as moscas querem.

Eu não queria escrever poemas.
Mas é como se me obrigassem a fazê-lo.

É como se eu fosse uma colmeia trancada
e um enxame quisesse vazar de mim
como vaza a menstruação do útero
como vaza o leite das tetas
como vaza o sêmen do falo
como é inútil tudo o que eu falo
como a água que vaza pro ralo.

O tempo escorre por entre meus dedos
e a potência jamais se metamorfoseia em ato:
sou do  esgoto o mais sórdido rato.